Instituto Ramacrisna já recebeu 55 jovens em cumprimento de medidas socioeducativas, resgatados do trabalho infantil e em acolhimento institucional

Thiago Euzébio é um dos craques do time de futebol americano do Cruzeiro, que acaba de se consagrar campeão do Campeonato Mineiro 2022.  Na rotina do atleta, que inclui treinos pesados e jogos acirrados, há ainda tempo para o trabalho e o estudo. Aos 20 anos, Thiago dá aulas de inglês para pessoas de baixa renda e acabou de se formar no curso de mecânica de máquinas pesadas, no Senai. Apesar da correria, o jovem diz que não se imagina mais feliz. Mas nem sempre foi assim. Até 2019, ele conta que andava por “caminhos errados”, com a prática de pequenos delitos e o envolvimento com o tráfico de drogas, motivo pelo qual chegou a ser preso várias vezes.

Em 2020, sua história se transformou por meio do projeto Descubra (Programa de Incentivo à Aprendizagem de Minas Gerais), quando cumpria medidas socioeducativas e foi encaminhado ao Instituto Ramacrisna. Na organização, estudou fotografia, fez amigos, encontrou acolhimento e inspiração. “A oportunidade bateu na minha porta e eu a agarrei com força. Renasci, aprendi coisas que jamais vou esquecer. O projeto Descubra e o Instituto Ramacrisna me tiraram da vida errada e me mostraram que eu poderia ter um futuro feliz”, conta.

Segundo Thiago, no Ramacrisna ele se capacitou e adquiriu conhecimentos que o levaram a ser aprovado no curso do Senai, disputando uma vaga com 500 concorrentes. Foi também lá que ganhou incentivo para começar a dar aulas de inglês, já que tinha o domínio do idioma por ter morado seis anos nos Estados Unidos. O atleta exalta as iniciativas e orienta outros jovens que estão na mesma situação em que ele esteve um dia. “Nem tudo está perdido para esses meninos e meninas que praticaram coisas erradas. Nunca é tarde para mudar para melhor. Aproveitem cada oportunidade que bater à porta, não desistam de vocês mesmos e valorizem as pessoas que os amam e tentam ajudar. Vocês não estão sozinhos”, aconselha.

Lançado em 2019, o projeto Descubra reúne órgãos e instituições federais, estaduais e municipais, como o Governo de Minas, Governo Federal, por meio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social, Tribunal de Justiça de Minas Gerais, Tribunal Regional do Trabalho de Minas Gerais, Senai, entre outros. É destinado a adolescentes e jovens em situação de vulnerabilidade social, prioritariamente os egressos do trabalho infantil, em cumprimento de medidas socioeducativas ou em acolhimento institucional, com idades entre 14 a 21 anos.

O Fórum de Erradicação e combate ao Trabalho infantil e Proteção ao Adolescente Trabalhador – FECTIPAMG tem compromisso permanente de afastar do trabalho jovens com a idade inferior a 16 anos e encaminhar para o trabalho decente os que já podem trabalhar no trabalho protegido e na aprendizagem. De acordo com a Coordenadora do FECTIPA-MG, Elvira Mello Cosendey o FECTIPA-MG sempre atendeu as demandas dos Conselhos Tutelares e das Instituições de Acolhimento Institucional para inserção dos jovens no mercado de trabalho através da aprendizagem. “Há um termo de cavalheiros pactuado com as Entidades Qualificadoras que participam do FECTIPA-MG, principalmente na RMBH, para inserção imediata desses jovens. Esses encaminhamentos continuam operante e concomitante ao programa DESCUBRA”.

Novas histórias

Em 2020, o Instituto Ramacrisna assinou o Termo de Adesão ao Acordo de Cooperação Técnica – Programa Descubra e passou a receber adolescentes e jovens encaminhados pelo projeto. Desde então, já foram 55 atendimentos. No Ramacrisna, eles têm acesso aos cursos de aprendizagem, como, por exemplo, em audiovisual e musicalização.  Segundo a supervisora de projetos do Ramacrisna, Aline Fauez, além das matérias obrigatórias, o diferencial é que, na organização, são oferecidas a esses adolescentes e jovens atividades complementares como oficinas de robótica, aulas de xadrez, de programação e atividades na impressora 3D.  Os participantes ainda assistem a palestras com psicólogos, assistente social e ex-alunos. O projeto Descubra tem uma carga horária de 800 horas e duração de 12 meses.

Para Aline Fauez, é gratificante ver o quanto os alunos do Descubra são aplicados e extremamente dedicados. E considera um privilégio acompanhar a evolução deles. “Temos, por exemplo, alunos no ensino de musicalização que nos disseram que jamais imaginaram que, um dia, aprenderiam a tocar piano, violino ou violoncelo e, hoje, estão em uma orquestra, um universo com o qual eles sequer sonhavam”, conta.

A vice-presidente do Instituto Ramacrisna, Solange Bottaro, é uma das entusiastas da iniciativa. “Além de serem capacitados, adquirirem conhecimentos, uma profissão e ainda recebem acolhimento, tratamento digno e respeitoso. Saem transformados, enxergando novas possibilidades de recomeçar. E esse é o objetivo maior do Ramacrisna, transformar vidas, dar novos horizontes a quem não tem nenhum, renovar esperanças e sonhos”, orgulha-se.

Construção da autoestima

Segundo Christiane Azevedo Barros, auditora-fiscal do trabalho e Coordenadora do Projeto de Inserção de Aprendizes no Trabalho, da Superintendência Regional do Trabalho em Minas Gerais, o grande diferencial do Descubra é ser um projeto mantido por diversas mãos, onde há efetividade do trabalho em rede. “Assim, conseguimos promover o resgate da cidadania e oferecer novas oportunidades a esses jovens que tiveram vários dos seus direitos violados, direitos constitucionalmente assegurados e previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente. Por isso, encontram-se em situação de fragilidade, com problemas de autoestima, e possuem bastante dificuldade em relação à escolaridade, à profissionalização e enfrentam grandes preconceitos para adentrarem ao mundo formal do trabalho”, complementa.

Encaminhados aos cursos de Aprendizagem por meio do Descubra, onde aprendem desde posturas adequadas até novas profissões, esses adolescentes e jovens ganham novas perspectivas. “São capacitados e encaminhados para o emprego. Passam a ganhar um salário e ter acesso a todos os direitos trabalhistas e previdenciários, com a assinatura da Carteira de Trabalho, como férias, 13º, folgas remuneradas, enfim, todos os benefícios CLT, assegurados em Lei”, detalha.

Para Christiane, os ganhos, no entanto, vão muito além. “O maior benefício, talvez, seja a construção da autoestima. O convívio com outras pessoas é enriquecedor. Saem do mundo deles e descobrem outras possibilidades, outro universo, outros paradigmas, é uma abertura de horizontes. São empoderados e começam a se ver como um sujeito de deveres, mas também de direitos”, explica.

Além do programa de aprendizagem, o Descubra oferta também cursos de pré-qualificação e cursos de qualificação profissional. Para saber mais acesse: https://www.descubraaprendizagem.mg.gov.br/